Seguindo carbonos dentro e fora do mercado: reflexões éticas em estudo para conservação de florestas
Resumo
Em um cenário de mudanças climáticas globais, estratégias de mitigação tomam por base a contraposição entre a emissão de carbono de origem antropogênica e a assimilação de carbono em sistemas florestais (terrestres ou costeiros). Assim, partindo da afirmativa óbvia de que a conservação das florestas e do carbono estocado nas mesmas contribui para mitigação do aquecimento global, e dos recursos disponíveis para tanto, muitos pesquisadores das áreas das ciências naturais investem esforços nos estudos dos processos de absorção de CO2 pelas plantas, de acúmulo C na biomassa aérea, nas raízes e no solo, de ciclagem da matéria orgânica, entre outros. Tais estudos visam quantificar os fluxos de C de modo a "operacionalizar" ações para mitigação do aquecimento global, que vem ocorrendo via mecanismos de mercado. Nessa configuração, a ética do pesquisador é garantida pela qualidade (precisão) da informação fornecida à sociedade e, em geral, sua crítica restringe-se ao mau uso destas. Mas, o que acontece quando este pesquisador percebe que as ações de mitigação, sob o discurso ambientalista e regulada pelo mercado, vem causando graves conflitos socioambientais envolvendo as pessoas que vivem diretamente das florestas? E quando reconhece que os dados de sua pesquisa contêm a solução previamente pensada e decidida na sociedade e que, por esse motivo, qualquer crítica aos mecanismos de mitigação, deveria ser antes uma autocrítica? Este artigo trata de explicar porque motivo (ético e político) uma pesquisa que se iniciou com a elaboração de modelos alométricos para determinação da biomassa e cálculo do sequestro de carbono de florestas de mangue terminou, por fim, com a descrição da rede sociotécnica do carbono.