Biocapital, diversidade e doença: reflexões iniciais sobre a pesquisa farmacêutica em seres humanos na América Latina
Resumo
O mercado de experimentos farmacêuticos em seres humanos, ou pesquisa clínica, vem se expandindo crescentemente mediante a terceirização das atividades de recrutamento de sujeitos para países do Sul Global. Para tanto, os grandes laboratórios farmacêuticos, sediados nos Estados Unidos e Europa, contratam Clinical Research Organizations (CROs), empresas especializadas na realização de pesquisas clínicas, que se encarregam pela condução completa do estudo em diversos países. Nesse cenário, a América Latina vem se destacando como região para a qual pesquisas vem sendo dirigidas, sobretudo por sua caracterização como um local que, com custos reduzidos, alcança bons resultados por contar com uma população grande e diversa étnica e racialmente, cuja grande parte dos indivíduos nunca recebeu tratamento para suas doenças. Baseada em materiais de divulgação de serviços de CROs com escritório na América Latina, bem como em entrevistas com profissionais que executam esse tipo de experimento no Brasil, identifico distintos modos com que as características de diversidade e falta de acesso a tratamentos na população latino-americana são retratados e
biocapitalizados no mercado da pesquisa clínica. Nesse caminho, argumento que a incorporação de populações latino-americanas funciona tanto como estratégia de produção de dados em nível global quanto de competição entre CROs a partir da produção de e especulação sobre populações disponíveis e dispostas a participarem dos experimentos.