Áridas memórias

seca, tempo e história no sertão de Pernambuco

Autores

  • Renan Martins Pereira

Resumo

Segundo uma certa tradição do pensamento social brasileiro, a história do sertão é uma história de secas e flagelos. A velocidade com que publicações, estudos e intervenções estatais se avolumaram do final do século XIX até os dias de hoje revela, com efeito, um espectro de pensamentos e de ações voltadas ao combate do assim chamado ‘problema da seca’. Essa imaginação intelectual esconde, entretanto, as particularidades das relações com as secas no mundo da experiência. Nesse sentido, algumas etnografias procuraram direcionar mais recentemente críticas à monumentalidade desse pensamento tradicional, entendendo não ser a seca um ‘problema’ que se deve ‘combater’, mas um fenômeno com o qual se pode ‘conviver’. A minha etnografia sugere uma complexidade de ordem distinta à das perspectivas do ‘combate’ e do ‘convívio’. Os relatos de meus interlocutores de pesquisa sobre as suas experiências na e com a seca não se deixam diminuir por qualquer imaginação estabilizadora, imóvel e imemorial do tempo histórico. Seus relatos sugerem uma memória ecológica feita dinamicamente a partir de um outro modo de pensar o ‘tempo’ e a ‘história’. No sertão onde faço pesquisa, no coração dos velhos e das velhas, sobretudo, resta conservada uma ecologia, em particular, a ‘fartura’ do ‘tempo antigo’ que, hoje, a memória resgata e faz durar. Lembrar muitas vezes sugere ser a seca mais uma condição irremediável do presente do que um fato incontestável do passado.

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Publicado

2022-04-28