“La mise en science du terroir”

implicações entre o conhecimento científico e o fomento das denominações de origem na produção de queijos AOC

Autores

  • Mayra Lafoz Bertussi

Resumo

Como uma estratégia de patrimonialização da produção alimentar, as denominações de origem são uma estrutura de classificação que incidem sobre a definição de quais artigos podem ou não fazer parte de um conjunto restrito e mais valorizado de mercadorias. Quando comparados às commodities, os produtos agroalimentares de origem protegida se diferenciam por uma imagem de tipicidade e autenticidade. O presente artigo tem como enfoque o selo de denominação de origem de maior reconhecimento na França, as appellations d’origine contrôlée. Baseada na noção de terroir, essa estrutura de certificação engaja argumentos geográficos, históricos e sociais para sustentar a singularidade do produto protegido. Ideias como tradição, savoir-faire, tipicidade se associam a fim de criar a singularidade do produto alimentar protegido. Interessado nos mecanismos de institucionalização da qualidade alimentar, o artigo investe na compreensão das transformações ocorridas no processo de internacionalização das denominações de origem para os queijos franceses. A inserção desse modelo para além do território francês, com o reconhecimento das appellations d’origine contrôlée junto à União Europeia e à Organização Mundial do Comércio, desencadeou uma série de controvérsias quanto à qualidade alimentar. Na Europa, concomitante à regulamentação dessa certificação para o conjunto de países membros, houve um incentivo para a solidificação da justificativa legal do estatuto privilegiado que as denominações de origem gozavam face às transações comerciais. Nesse contexto, foi estimulado um processo de legitimação dos selos via intensificação de critérios produtivos. A delimitação de raças bovinas tidas como tradicionais, a valorização do capim e do feno como ração de base e a interdição ou diminuição da alimentação fermentada para as vacas, o uso preferencial do leite cru como argumento de preservação da diversidade sensorial, gustativa e cognitiva do terroir, a extensão do tempo de maturação dos queijos são exemplos de critérios incentivados a partir do período de extensão das appellations d’origine contrôlée para Europa. Com uma abordagem etnográfica e uma pesquisa de campo concentrada na região Auvergne, o artigo pretende compreender o papel da expertise científica dentro da justificação de processos considerados tradicionais de produção alimentar.

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Publicado

2022-04-28