Aprender a responder à intrusão de Gaia
práticas de uma horta urbana
Resumo
Considerando que vivemos a “intrusão de Gaia”, nome que Stengers (2015) dá ao grande acontecimento que se desdobra em ocorrências como o aquecimento global, as extinções de espécies, entre outras catástrofes, uma pergunta parece importante: que respostas locais temos conseguido construir? Este trabalho toma em análise uma experiência de horta urbana localizada na cidade de Porto Alegre, estado do Rio Grande do Sul/Brasil, para compreender as aprendizagens de um grupo de praticantes de horta em um território periférico da cidade. Para pensar a experiência aqui narrada, articulamos o vivido na horta comunitária em questão às obras de um conjunto de autores que compõe o horizonte interpretativo denominado por Carvalho e Steil (2014) de epistemologias ecológicas. A pergunta que nos coloca a refletir é: de quais modos é possível construir respostas à intrusão de Gaia? Estamos entendendo, a partir de Stengers (2015), que as respostas baseiam-se no engajamento em relação às experimentações que buscam criar possibilidades de um futuro não bárbaro. Seguimos também uma perspectiva ecológica de aprendizagem, baseada na noção de prática em correspondência (Ingold 2020) com diferentes seres. Com as e nas práticas deste particular espaço comunitário foi possível acompanhar o desenvolvimento de habilidades relacionadas à aprender como aprender a ser, a habitar, e a desenvolver habilidades, ao mesmo tempo em que se constrói vínculos de pertencimento a um lugar, a uma comunidade que coproduz respostas contingentes às lógicas capitalistas, coproduzindo também a si mesma. Experiências como as das hortas urbanas implicam na criação de vida a partir de conexões, do estabelecimento de redes de ação. Vida que explora novas potências de agir, sentir, imaginar e pensar. Práticas dessa natureza parecem povoadas por humanos que tem sido compelidos a tentar mudar modos de viver, afetiva, mas também, politicamente, levando em consideração que para responder à intrusão de Gaia talvez seja necessário agir em correspondência com o outro, com toda a complexidade que isso representa. Adotar essa perspectiva é afirmar que a resposta à intrusão não será aquela de uma humanidade reconciliada (Stengers 2015), mas será aquela que depende do repovoamento de um mundo que foi devastado e hoje precisa reestabelecer capacidades coletivas de pensar, imaginar e criar.