Agenciando casas e(m) movimentos
O trabalho cotidiano de mulheres vaqueiras e a categoria feminina na vaquejada pé de mourão cearense
Resumo
Com base em um estudo etnográfico realizado em duas fazendas no município de Sobral (CE), esta pesquisa busca analisar o trabalho feminino exercido nessas casas de morada e a presença das mulheres nas vaquejadas pé de mourão cearenses a partir da existência de um coletivo denominado Associação Feminina de Vaqueiras da Vaquejada Pé de Mourão (AFEVA). A partir da problematização da invisibilidade das mulheres, do seu apagamento em espaços públicos e privados, e a escassez de produções envolvendo mulheres na agropecuária sertaneja, procuro demonstrar como as vaqueiras aparecem a partir do razoável sucesso obtido por elas com a AFEVA e a categoria feminina, que apesar de mínimo, aciona a sua presença na cena pública, performática e ritual das vaquejadas. As mulheres, enquanto sujeitos generificados e relacionados ao cuidado (seja ele direcionado a criação dos filhos, da casa, dos animais - de terreiro e/ou de seus cavalos de corrida), quando associadas à dimensão feminina-materna, lidam com julgamentos morais concernentes a ser ou não uma boa mãe, principalmente pela constante necessidade de mobilidade que as competições acionam. Essa movimentação provoca ainda adaptações quanto ao uso da “casa”, visto que, por se estenderem por mais de três dias, os caminhões-boiadeiros ocupam nesse cenário de disputas, a função de casa para vaqueiros e vaqueiras, sendo esse o seu local de descanso, banho e preparo de refeições. Destaco que esse movimento de mulheres, apesar dos ideais de rompimento com uma estrutura dominante masculina, não necessariamente coincide com aqueles dos movimentos feministas, mas ocorre dentro de um agenciamento feminino como maneira de viver uma “tradição” centrada na masculinidade, causando rupturas, efeitos e transformações importantes ao longo dessa inserção.