“O Jara só vai embora quando você morre”

Notas sobre alteridade e a produção de uma cosmopolítica do corpo Kaiowá e Guarani

Autores

  • Arthur Paiva Octaviano UFGD

Resumo

Refletir os modos de fazer política entre os povos Kaiowá e Guarani envolve algumas prerrogativas, entre elas as relações que estes estabelecem com outros mundos, em uma comunicação realizada pelos Ñanderu e Ñandesy, respectivamente o xamã homem e a xamã mulher, com os guardiões dos “modos de ser”, os Teko Jara”, os quais estão distribuídos pelos reinos animal, vegetal, mineral e fluvial. Desse modo, o que se convenciona por “natureza” não se trata como o espaço amorfo e inabitado, conforme preconizado pelo pensamento moderno e euro-americano, no caso dos povos falantes de língua guarani, este é o lugar habitado por uma série de seres intencionais, sejam estes humanos ou não humanos, onde a palavra - ñe’e, circula por entre estes lugares talvez seja o estatuto que mais toque estruturalmente a existência destes povos, assim, são as palavras que fazem as pessoas e as pessoas são feitas de palavras, a rigor a natureza é mais um espaço da multiplicidade de relações políticas dos Kaiowá e dos Guarani. Portanto, ao se tratar da noção de pessoa e a categoria de humano – ava, significa tomar as qualidades relacionais que o corpo desempenha nas cosmologias dos Kaiowá e Guarani. A inspiração deste trabalho surgiu durante uma conversa entre mim e três jovens Kaiowá na aldeia Tei’y Kue, no município de Caarapó, no estado de Mato Grosso do Sul, durante uma reunião do conselho de juventude Kaiowá e Guarani. Na ocasião conversávamos sobre os problemas que os Kaiowá e Guarani lidam rotineiramente em suas aldeias, como as violências, suicídio, arrendamento de suas terras e a mudança pela qual a paisagem passou após sucessivos processos de devastações, na ocasião perguntei a um dos três, que é professor na escola indígena Pa’i Chiquito, da Aldeia Panambizinho, em Dourados- MS, se os jara iam embora depois que a floresta estivesse totalmente devastada, ao que ele me respondeu que, depois que desmatada a floresta, os jara ficavam em um patamar celeste superior, esperando que a reza de um rezador os fizesse descer, e que eles estavam ao nosso redor sempre, e que só iriam embora com a morte do corpo do ava. Contudo, este trabalho visa refletir as categorias relacionais e políticas que envolvem a noção de pessoa e produção do corpo, bem como suas implicações nos contextos de luta e reivindicação dos povos Kaiowá e Guarani por seus direitos territoriais e modos de ocupação espacial.

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Publicado

2024-11-18

Edição

Seção

ST21 Lutas indígenas e de populações tradicionais: regimes de criatividade e territorialidades em risco