Repensando questões de autoridade e autonomia a partir das experiências farmacológicas de portadores de HIV
Resumo
O presente trabalho se propõe a analisar os chamados “clubes de compradores” bem como os grupos extralegais de testes clínicos que surgiram nos Estados Unidos ao longo da década de 1980 e através dos quais pacientes diagnosticados como portadores de HIV obtinham medicamentos não regulamentados dentro do país na tentativa de encontrar terapias mais eficazes e menos nocivas do que aquelas proporcionadas pelo uso do AZT (primeira droga a ser usada no tratamento da síndrome). A partir de perspectivas da Antropologia do Corpo e Saúde e dos Estudos Sociais da Ciência e me valendo de uma literatura especializada, busco reconstituir o fenômeno destes experimentos pensando as implicações, significados e dilemas que emergem nestes momentos em que grupos de pessoas assumem para si a responsabilidade de testar drogas e terapias em seus próprios corpos atuando a margem das instituições reguladoras do Estado. Sendo assim, o fio condutor desta reflexão será justamente a questão da tensão entre a autonomia do sujeito e os aparatos institucionais que regem e conduzem a produção médico-científica. Tentarei, portanto, levantar questões e contribuir para o debate sobre o que é produzido por esta tensão e sobre as evidentes dificuldades que emergem quando o sujeito reclama o lugar de autoridade máxima sobre o que é mais ou menos arriscado em se tratando de questões de saúde que podem resultar efetivamente em sua sobrevivência ou morte. Mais que isso, procuro refletir sobre como estas reivindicações desafiam e transformam certas hegemonias e autoridades constituídas socialmente sobre quem pode “praticar” ciência, e sobre como esta deve ou não ser produzida.