Mariposas, ontologias alienígenas e seus quefazeres terrestres
Resumo
Até pouco tempo, a literatura antropológica relativa ao tema da ufologia, assim como dos coletivos ufológicos, esteve quase que integralmente dominada por trabalhos que se valem do binômio crença e representação. O comprometimento com estes dispositivos conduziu estas pesquisas ou à tentativas de interpretar a disciplina segundo o registro de uma “ciência” agonizante, ou segundo uma “mecânica” que repousaria subjacente às práticas dos ufólogos – atenta, portanto, ao que elas dissimulam. Mais recentemente, Pierre Lagrange, inspirado nos trabalhos de Bruno Latour, abriu uma possibilidade mais arejada para a “antropologia da ufologia” ao endereçar a seguinte questão: “o que se passa em um affair ufológico?”. Neste artigo, produto de minha etnografia junto aos ufólogos brasileiros, retomo a pista inaugurada pelo pesquisador francês e me debruço sobre os meandros de uma contenda no bojo deste coletivo. A disputa concerne à questão de saber se um registro de imagem em uma câmera de segurança no interior do Rio de Janeiro consistia na gravação do pouso de uma nave extraterrestre ou se tratava da imagem de uma mariposa. O debate em torno deste evento articula discussões sobre os processos levados à cabo para a identificação de imagens pelos ufólogos, suas definições pragmáticas daquilo que conta como uma evidência e, sobretudo, seus modos de operação em campo. Além de figurar como uma contribuição à antropologia das “ditas” paraciências, o presente texto também consiste em um esforço no sentido de pensar como os UFOs, em sua parcial visibilidade, engendram as socialidades ufológicas.