Tecnologias de autocuidado e tecnologias digitais
agenciamento sociotécnico, ética do cuidado e colonialidade
Resumo
Os estudos feministas do cuidado e os estudos feministas da ciência pensam o cuidado com uma tripla dimensão, a saber; estado efetivo vital; obrigação ética e trabalho prático. O cuidado tem sido capturado dentro das relações do capital- virando indústria de serviço, produto, elemento de empreendedorismo liberal- como também habitado e co-produzido por plataformas digitais. Cuidar é uma tecnologia de vida e com implicações materiais vitais para o mundo. O cuidado é sempre situacional e “situar tecnologias é uma tentativa de desconstruir a universalidade que se impõe, violentamente, em diversas esferas da vida” (Hui, 2020). Assim, este trabalho se debruçará sobre o elemento autocuidado na tríade que compõem o direito ao cuidado, a saber, direito de cuidar, de ser cuidado e de autocuidado; para assim, discutir as tecnologias do autocuidado em sua composição com plataformas digitais e seus agenciamentos, a partir do diálogo entre a ética do cuidado, proposta por Donna Haraway e Maria Pluig de Bellacasa, e as discussões de colonialidade de gênero, de poder, do ser e saber. O conjunto de reflexões que apresentaremos será costurado por uma proposta ético-teórica do cuidado feminista, o que implica maneiras de habitar o mundo no qual se cultive as artes da atenção stengersiana. Atenção ao reconhecimento de outras existências e às multiplicidades de perspectivas sociotécnicas que coengendram o mundo comum. A perspectiva adotada aqui entende que as maneiras de estudar, analisar, representar diferentes coisas, sejam de humanos ou não-humanos, situações, ambientes, etc tem efeitos criadores de mundo, em seu aspecto ontológico, metafísico e especulativo do cuidado. Uma noção feminista de cuidado complexifica as questões e assume o compromisso especulativo de pensar fazeres e práticas cotidianas éticas e afetivas; fazeres que encarem os incômodos das existências interdependentes. Esse compromisso articula-se com as discussões do chamado feminismo decolonial. Assim, a análise de diversas práticas e experiências de autocuidado co-produzidas por plataformas digitais, a exemplo do Instagram, será também costurada pelos estudos a cerca da colonialidade do poder/ser/saber/ genro e dados a fim de indagar a produção de colonialidade na plataformização do autocuidado e evidenciar possíveis práticas de resistências decolonial com engendramentos inclusivos e afetivos.